Hippies

Oba, blog muito bom sobre o universo dos anos 60:

http://anos60.wordpress.com/

De cara já surrupiei um post que tem tudo a ver conosco, divirtam-se:

Os Hippies, junto com a Nova Esquerda e o Movimento dos Direitos Civis, são o tripé daquilo que ficou conhecido como Contracultura. A palavra ‘Hippies’, – de hip, hipsters, que vem de hep, que quer dizer, estar por dentro, descolado, bacana, – saiu na imprensa pela 1ª vez, no artigo “A New Haven For Beatniks”, em 5 de setembro de 1965, assinado pelo jornalista de San Francisco, CA., Michael Fallon. Nesse artigo ele escreve sobre o “Blue Unicorn”, um coffee house, usando o termo hippie para se referir à nova geração de beatniks que se mudaram de North Beach para Haight-Ashbury, distrito de S. Francisco. Mas tornou-se massificado pela mídia a partir de 1967, depois que o colunista Herb Caen, do “Crônica de S. Francisco”, passou a se referir a hippies, em suas colunas diárias. Segundo Malcolm X, a palavra hippy, que aparece na língua Wolof do oeste africano, tem reminiscências no fim dos anos 40 no Harlem e era usado para descrever um tipo específico de ‘branco’ que age de forma mais ‘negro’ que os negros. Porém, suas raízes remontam aos filósofos gregos Diógenes de Sinopes (e os Cínicos) e Epícuro de Samos.

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Diógenes de Sinopes ( 413 a.C. – Sinop, hoje na Turquia), é o maior representante do cinismo. Ele desprezava a opinião pública, e seus únicos bens eram um alforge, um bastão e uma tigela (que simbolizavam o desapego e a auto-suficiência perante o mundo). A felicidade, entendida como auto-domínio e liberdade espiritual, era a verdadeira realização de uma vida. Defendia a liberdade sexual total, a igualdade entre homens e mulheres, a supressão das armas e da moeda, entre outras coisas.

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Epícuro de Samos (341 a.C. – Atenas – discípulo de Diógenes), dizia que ser feliz era mais barato do que se pensa. Considerava que a busca da felicidade e do prazer estavam condicionadas ao domínio sobre as emoções e sobre si mesmo, e elegeu 3 questões principais frugais para alcançar a felicidade. 1. Amigos – não apenas tê-los, mas conviver com êles. Comprou uma grande casa, convidou um monte de amigos para morar juntos e assim, foi um precursor da vida em comunidade. 2. Liberdade pessoal – sem dependência de patrões cruéis. Independência em relação ao consumismo, e, 3. Auto-reflexão, encarar as questões que incomodam de frente, analisá-las com sinceridade e resolvê-las. Paradoxalmente, sofria de cálculos renais.

As influências também passam pelas idéias de Jesus Cristo, Buda, São Francisco de Assis, Krishna, Gandhi, Henry David Thoreau (Walden ou A Vida nos Bosques e Desobediência Civil), e outros. Em 1890, inspirados nas obras de Nietzche, Herman Hesse e Eduard Baltzer, jovens alemães iniciaram um movimento de volta à natureza, abandonando seus status sociais e buscando valores espirituais pagãos que tinham raízes em seus ancestrais. Com a imigração alemã para solo norte americano, décadas depois, surgiu a 1ª loja de produtos naturais, mais saudáveis, no sudoeste da Califórnia, onde puderam praticar um estilo de vida mais alternativo em um clima mais ameno. Jovens americanos influenciados por esse estilo de vida criaram um grupo chamado “Nature Boys” e se fixaram no deserto californiano. Esse movimento tornou-se popular em 1947 quando Nat King Cole gravou uma canção “Nature Boy” * (que é linda, vale a pena ouvir), de autoria de um dos integrantes do grupo, Eden Ahbez. Remanescentes desse grupo, incluindo o famoso Gipsy Boots, foram para o Norte da Califórnia em 1967, bem à época do Verão do Amor, San Francisco. Também o movimento jamaicano Rastafari, propunha volta à natureza e volta às raízes filosóficas africanas. Na década de 50, por causa da imigração em larga escala de jamaicanos para a Inglaterra, influenciou o desenvolvimento do movimento hippie inglês com contatos que permitiam aos jovens brancos comprar cannabis das comunidades negras.

O Verão do Amor, 1967, em S. Francisco, a capital dos hippies, foi um evento que atraiu 200.000 pessoas e um consumo inacreditável de LSD. Allen Guinsberg (”Uivo”), Jack Kerouac, (”Pé na Estrada”), os ‘beats’ novaiorquinos entre outros, chegaram a S. Francisco, onde criaram um reduto inicialmente em North Beach. “Se você for a S. Francisco, não deixe de colocar flores em seus cabelos”, dizia a canção de John Phillips, dos Mamas and The Papas, cantada por Scott Mackenzie.

Conceitos como paz, amor, liberdade sexual, maconha, LSD, underground e contracultura, começaram a antagonizar aos da Guerra do Vietnã, materialismo, consumismo, individualismo. Emergiam novos e urgentes referenciais. Os hippies eram básicamente contestadores, isso fruto de educação mais liberal, o que estimulava uma maior capacidade de expressão crítica, de se colocar diante de fatos como poluição atmosférica, questão ambiental, racismo, pobreza, o estilo dos pais, o consumismo exagerado. Contra o stablishment, os valores da classe média, armas nucleares (principalmente na Inglaterra), a Guerra do Vietnã (principalmente nos EUA), políticas ortodoxas, Nixon, ultra direita, doutrinação ideológica. A favor do paganismo, religiões e filosofias orientais, liberação sexual, LSD, expansão de consciência, vida em comunidades, paz, amor liberdade pessoal.

Essa era a cena hippie. Básicamente sairam do campo para a cidade e lá, pregavam o contato com a natureza e a volta para o campo, ao mundo caipira, que não gostavam dos hippies. Caipiras gostavam de música country, Willie Nelson ou até de Bob Dylan e Joan Baez. Nos anos 60 o folk foi eletrificado (Byrds, com influência Beatles e Dylan). A cultura hippie era mais comportamental que musical, mas influenciaram caipiras, folks, beats, Beatles e outros na Inglaterra e Europa que influenciaram sua contrapartida norteamericana e na fusão de rock, folk, blues e rock psicodélico. Cabelos e barbas compridos, eram considerados ofensivos para quem não estava associado à contracultura. A língua oficial era o rock. E mesmo sendo o movimento caracterizado pela busca do prazer, não arregavam diante da opressão e das injustiças sociais. A “festa” começou com uma comunidade urbana que se chamava The Family Dog, que organizaram o primeiro baile de rock na cidade, em 16 de outubro de 1965, no Longshoreman’s Hall, animados por 4 bandas locais. Depois disso, o point mais quente migrou de North Beach para a área em volta da esquina da Haight com Ashbury, um reduto negro que foi redecorado com cores psicodélicas, artigos orientais, muito incenso e óbviamente, muito LSD.

Vida comunitária, amor livre, culto à natureza, religiões orientais, astrologia, tarô. Nascia o psicodelismo.  The Family Dog acabou em 1966, e os bailes passaram a ser organizados por Bill Graham, dono do Filmore Auditorium, que viria a ser o templo do rock dos anos 60; e por Chet Helms, dono do salão Avalon, que mandou trazer do Texas uma velha amiga: Janis Joplin (foto abaixo), a futura musa dos hippies, que seria a cantora da banda da casa, o Big Brother & Holding Company.

Em janeiro de 1967, foi convocada uma “Reunião de Tribos” no Golden Gate Park, onde aconteceria o World’s First Human Be-In, que teve a presença de ceca de 20.000 jovens cantando, dançando, cobertos de flores, colares e pulseiras de contas. A partir daí, esperava-se a chegada de 100.000 hippies em junho de 1967, para o chamado Verão do Amor. Vieram 200.000 (foto maior, abaixo) como escrito mais acima. Eles foram chegando, a Comissão de Parques liberou áreas em torno de Haight-Ashbury para sacos de dormir (abaixo, uma imagem fashion no evento).

O Sgt. Peppers Lonely Heart Club Band (Beatles, 1.06.67), contribuiu muito para o deslanchamento do Verão do Amor. Esse disco elevou o rock à categoria de arte. Melodias incandescentes, sons e texturas psicodélicas e justaposição de rock com barroco, faz com que irradie ondas de choque através da paisagem musical.

A exploração turística foi tão grande que, a partir desse evento, os hippies deixaram Haight-Ashbury, e foram viver em comunidades rurais. Sociedade alternativa. Nasceram muitas comunidades. Passaram a criar e elaborar produtos limpos, naturalistas e feitos artesanalmente, que logo foi engolido pelo sistema, que percebeu o potencial comercial desses produtos de consumo com grande apelo conceitual, natural. O que aconteceu em S. Francisco em 1967, refletiu o que estava acontecendo ou iria acontecer em quase todas as cidades do mundo industrializado.

É fato que o espírito criativo e positivo iniciado em 1961começou a desaparecer com a visão horrorosa da Guerra do Vietnã, os assassinatos de John e Robert Kennedy, e de Martin Luther King. O Movimento Hippie é idenficado com a “We decade”, conforme colocou Tom Wolf, em contraposição “a “Me decade” simbolizado pelos anos 70. Colaborou com aspectos inovadores, criativos e humanizadores. O espírito de “conheça-se e expresse-se” do começo e do meio dos anos 60, combinava idealmente com sensibilidade comunitária e identificação grupal. Começou nos EUA nos 60, foi para outros países e teve seu declínio nos anos 70.  Mas deixou marcas para as gerações seguintes: Amor Livre; Vida em comunidade; Negação de todas as regras do capitalismo; Decisões tomadas em conjunto; Agricultura de subsistência; Troca solidária como moeda; Moda: Roupas brilhantes de inspiração indiana, estampas inspiradas em motivos psicodélicos; Valores religiosos com influência oriental; Pacifismo e contra as guerras; Bases do Movimento Ambientalista. Influências na cultura como: HQ; Poesia Concreta; Cultura de Massa; Artes Plásticas: artistas inspiram-se em conceitos hippies para criar suas obras.

A pintura que ilustra a capa do livro acima, é de Isaac Abrams, “All Things Are One Thing” (Todas as coisas são uma coisa só), óleo sobre tela, 1967. Foto de Alan Meyerowitz, para a exposição “Summer of Love”, Arte da Era Psicodélica – 27/5 – 25/9, 2005 – Tate Liverpool, UK www.tate.org.uk/liverpool

O Rolls Royce mais acima pertenceu a John Lennon

* Nature Boy ( Música e Letra de Eden Ahbez)

There was a boy / A very strange and enchanted boy / They say he wandered very far, very far / Over land and sea / A little shy / And sad of eye / But very wise / Was he. / And then one day / A magic day he passed my way / And while we spoke of many things, fools and kings / This he said to me /  “The greatest thing / You never learn / Is just love and be loved in return”.

Tati


Ar-now-do Baptista! Mais do que recomendação

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Saiu hoje no JT!

Ex-Mutantes lança livro de ficção científica

São Paulo – Além de uma música revolucionária, que mudou a face dos anos 60 e ecoa ainda hoje, o ex-Mutante Arnaldo Dias Baptista faz desenhos, quadros e camisetas que dá de presente aos amigos. Agora, uma nova faceta de sua carreira multimídia vem à tona: a literatura. A Editora Rocco lança no início de abril o livro Rebelde Entre os Rebeldes, uma ficção científica de Arnaldo que foi escrita há mais de 20 anos, mas permanecia inédita.

Tem um disco antigo do gaúcho Ney Lisboa, uma espécie de Tom Waits sulista, intitulado Pra Viajar no Cosmos Não Precisa Gasolina, de 1983. Não há expressão melhor para definir a ficção de Arnaldo Baptista. A viagem interplanetária do Príncipe do País dos Baurets é totalmente delirante, uma espécie de Star Wars hippie, escrita num ritmo e linguagem que não existem mais, de tão delicados e fluentes.

“Eu não sei se essa experiência já ocorreu com você, leitor, mas às vezes estou andando ao lado de um amigo em plena Avenida Nossa Senhora de Copacabana ou qualquer outra grande avenida, com a fortíssima materialidade das lojas me levando a só acreditar no que se vê e, apesar disso, sinto algo especial”, escreve Arnaldo.

Em maio de 2006, ao lado de seu irmão Sérgio Dias, Zélia Duncan e Dinho Leme, Arnaldo ressuscitou por um breve período, um ano, o sonho psicodélico chamado Mutantes. Durou pouco, mas reanimou um pequeno exército de maluquetes bacanas. Com seu livrinho temporão, mais eflúvios deverão vir à tona. As informações são do Jornal da Tarde (AE)

God Save the King!

Aline


1ª Mostra Cultural Arte dos Hippies

já foi… mas vale ficar sabendo!

CULTURA PERIFÉRICA
Nas quebradas, toca Raul
Um bairro da Zona Sul de São Paulo vive a 1ª Mostra Cultural Arte dos Hippies. Na periferia, a pregação do amor e liberdade faz sentido. É lá que Raul Seixas continua bombando em shows imaginários, animando coros regados a vinho barato nas portas do metrô, evocando memórias e tramando futuros
Eleilson Leite

No próximo domingo, dia 9 de março vai acontecer a 1ª Mostra Cultural Arte dos Hippies. O evento terá lugar na Praça do Campo Limpo, gema da periferia da Zona Sul de São Paulo. A parada começa às 10h e segue até às 20h. A idéia, segundo os organizadores é reunir o maior número de “sobreviventes” da cultura hippie, promover uma feira, curtir um som e, com isso, reiniciar um movimento que teve seus tempos de glória, no Brasil, nos anos 70. Se nos EUA os hippies escolheram uma bucólica fazenda no Interior do Estado de Nova York para celebrar a paz e o amor, no final da década de 60, o Woodstock paulistano fica num dos picos periféricos mais adensados e conflituosos da Capital. Mas ser hippie hoje, em nossa terra, só na periferia. É na quebrada que a pregação do amor e da liberdade faz mais sentido. Tanto como valor intrínseco às comunidades , como demanda às autoridades. Mas ser hippie é coisa também de quem gosta do Raul Seixas — patrono do evento, juntamente com Bob Marley. Nada mais justo que essa homenagem ao Raul.

Raul Seixas já era um ídolo para os hippies dos anos 70 e 80. Mas virou um mito para parte da geração que tem hoje vinte e poucos anos e sequer viu uma apresentação do compositor baiano. O organizador da Mostra de Cultura Hippie, Valdecir Jr., conhecido como Jotta Erry, é um exemplo dessa rapaziada. Tem apenas 24 anos. E olha o perfil do cara. Terminou o segundo grau e ainda aspira à faculdade. Mora na periferia, trabalha na ONG Rede Rua, como educador junto às pessoas que vivem nas calçadas e sob viadutos. Jotta Erry é fã do Raul e toca reggae na banda Raízes de Javé. É um típico artista da periferia: talentoso, solidário, empreendedor e ativista. Quando o Raul morreu, tinha apenas 5 anos. Não pôde vê-lo em ação, mas embalará, com seu evento, os ideais da Sociedade Alternativa, defendida pelo seu ídolo.

Eu sou dos anos 80 e acabo de fazer 40. Vi dois shows do velho Raul. Sinto-me um privilegiado. Mesmo naquela época, era rara uma aparição do Maluco Beleza nos palcos. E quando aparecia, não era garantia que o show rolasse. Raul chegou a ser preso em 1982, acusado pela platéia de ser um impostor. A treta rolou em Caieiras, município da Grande São Paulo. Ele entrou no palco pra lá de bêbado e não conseguia lembrar as letras. A galera irada foi às vias de fato. Raul saiu escoltado e foi dar explicações na delegacia mais próxima. Parecia ser o fim.

Mas ele ressurgiu. No ano seguinte, no dia 26 de fevereiro, mais de 10 mil pessoas lotaram o ginásio do Palmeiras para ver o retorno épico de Raul Seixas. E eu estava lá. Havia acabado de fazer 15 anos. A platéia, ansiosa, alternava momentos de confiança e descrédito. O cara entrou no palco, já passava da meia noite. Se o Raul não aparecesse naquela noite, talvez o ginásio do Verdão viesse abaixo, literalmente. O público delirava e Raul, não bastasse o inusitado de sua presença, resolveu surpreender ainda mais. Com Tony Osanah na guitarra, e Miguel Cidras nos teclados, só tocou clássicos do rock norte-americano dos anos 50. Em tom professoral, introduziu sua aula: “o rock começou no Mississipi, nos anos 50 com Arthur Big Boy Grudup, que influenciou um cara chamado Elvis Presley com uma canção mais ou menos assim…”. E mandou My baby left me. E assim foi durante um pouco mais de uma hora. Nada de Gita, Maluco Beleza, Ouro de Tolo. O povo gostou, mas reclamou. No fim, valeu pelo momento histórico. Quem quiser conferir é só ouvir o CD lançado pela Eldorado contendo o registro deste show.

Raul morreu em agosto de 1989, e foi então que os universitários enterraram o cara mesmo. Mas acontecia um movimento inverso, nos bairros de periferia
Depois desta apresentação, mais um período de ostracismo e internações, até que Raul entrou em estúdio, depois de três anos sem gravar. Tirou do forno um grande disco. Trata-se do Raul Seixas, álbum que veio ancorado em dois mega sucessos: Carimbador Maluco e DDI, rocks bem ao estilo Raul, fã incondicional de Elvis Presley. Comprei o disco no dia em que chegou nas lojas. Lá no bairro, fui o primeiro a chegar com a novidade. Reunimos a galera e nos deliciamos com as novas canções. Raul estava de volta. E voltou com gás. Dava entrevistas, participava de sessões de autógrafos. Chegava três horas atrasado, é verdade, mas aparecia. Fui a uma dessas sessões, numa loja no Top Center na Av. Paulista. Estava marcado para as 11h. Negociei no trampo uma hora a mais de almoço. Cheguei pontualmente. A fila era enorme. Deu meio dia e nada. Muita gente desistiu. “O Raul não tem jeito” resignavam-se os fãs menos convictos. Meu acordo era de estar de volta ao escritório as 13h. Liguei em casa. Pedi para meu irmão de apenas doze anos vir me substituir na fila. Morava na periferia da Zona Norte. O moleque chegou as 13h20 e o Raulzito nada de aparecer. Tomei bronca do chefe e fiquei sem almoçar naquele dia. Lá pelas 14h30, liga o garoto. “E aí, ele apareceu?”, perguntei incrédulo. “Apareceu, mas o autógrafo ficou no meu nome”, respondeu o mano. Naquele dia entendi o significado da expressão “gozar com o pau dos outros”. Guardei a relíquia por muitos anos.

Não sei bem a data, mas fui ver o show de lançamento deste disco, agora, que ironia, no Ginásio do Corinthians. Era 1984. Raul faria apenas um show. Com ele, não tinha esse negócio de temporada. Tampouco, os empresários topavam qualquer acordo do gênero. O risco de furo era permanente. Novamente, casa lotada. Tinha quase 10 mil pessoas, imagino. Dessa vez, o público estava confiante. O Raul estava bombando nas rádios e na TV. Até no Balão Mágico, programa infantil da Globo, para o qual escreveu Carimbador Maluco, ele aparecia. Vivia um momento de astro. Na abertura, nada menos que as duas maiores bandas de rock da época: Tutti Fruti e Made in Brazil. Raul entrou triunfante no palco. Uma banda super afinada com Tony Osanah e Miguel Cidras novamente o acompanhando. Mandou super bem os sucessos do momento e do passado. Uma glória. Este era o velho Raul. O público curtiu sem muita ansiedade. O clima era de paz e amor. Acabado o espetáculo, a multidão saiu pelas ruas do Tatuapé, como se estivesse numa procissão. Um puxava os primeiros versos de uma canção e os demais seguiam em coro. Muita gente sentou na porta da estação do Belém do Metrô e por ali ficou até as 5h esperando o portão abrir, cantarolando Raul sem parar, em rodas regadas a vinho Natal, comprado nos butecos especializados em atender os insones que vagueiam na madrugada. Eu subi num buzão na Av. Celso Garcia. Segui para o Centro e de lá, as 4h peguei o Negreiro, nome que se dava ao ônibus que cobria a rota para as periferias depois da meia noite. Percebi que muita gente fazia o mesmo itinerário.

Quando entrei na USP, em 1988, comprovei que a classe média ilustrada e politizada torcia o nariz para o Raul Seixas. O pessoal gostava dos medalhões da MPB (Chico, Caetano, Gil, Milton, etc.) e da Vanguarda Paulistana, que ainda gozava de amplo prestígio: Arrigo Barnabé, Itamar Assunção, Premeditando o Breque entre outros. Rock? Ah, era a nova geração: Titãs, Paralamas, Legião Urbana, Barão Vermelho, Lobão e toda essa galera. Bom. Eu gostava de tudo isso, mas não tirava o Raul do topo de minhas preferências. Sentia-me meio um ET, nas conversas na mesa do bar. Saquei que meu apreço pela Raul tinha a ver com minha procedência. Muitas vezes, eu era o único ali que veio do subúrbio. Ser da periferia na USP, naquele tempo, era algo tão improvável que até moradia estudantil eu consegui. Lembro-me que a assistente social foi até em casa para checar minhas “condições de vida”. Assinou na hora a aprovação de minha vaga no CRUSP e ainda me deu bolsa-alimentação.

Para meus amigos, curtir Raul era coisa de “bicho grilo”, expressão desdenhosa para se referir aos hippies que insistiam em manter a conduta paz e amor. O Raul morreu em agosto de 1989, e aí que os universitários enterraram o cara mesmo. Mas acontecia um movimento inverso, nos bairros de periferia. Crescia a legião de fãs do Maluco Beleza. E muitos jovens aderiram à Raulmania, formando fãs-clubes, grupos de discussão sobre a Sociedade Alternativa, e tudo mais. Olha que louco! Essa galera saía em bandos para ver shows de artistas covers do Raul. Em apresentações de outros artistas era comum gritarem do meio da platéia: “Toca Raul!”. Virou um bordão. O Zeca Baleiro tem brincado com isso em seus shows. No programa BR 102 da Rádio Kiss FM tem lá uma seção “Toca Raul!”. Outro dia fui ver uma apresentação de um cover do Raul no Ibira Moto Point, encontro semanal de motoqueiros no Ginásio do Ibirapuera. Tinha uma multidão. A rapaziada era toda da periferia. Entrei no meio e curti um bocado. Notei que lembrava a letra inteira de dezenas de canções. Tornar-se fã do Raul é como andar de bicicleta. Você pode ficar um tempo inativo, mas não capota da magrela nunca mais.

Que bom ver agora esta belíssima iniciativa da Primeira Mostra Cultural Arte dos Hippies, que vai rolar no Campo Limpo, no próximo domingo. Entre as 8 bandas programadas para subir no palco evento, uma delas só toca Raul. É a Tecora. Todas as demais são de Reggae. Jotta Erry me explicou que os hippies estão muito ligados no som da Jamaica. “O reggae virou a trilha sonora dos que seguem o estilo de vida hippie”, diz o educador. Mas o Raul está no coração de todos e é inspiração permanente. “A galera se reúne em grupos e nas rodas só dá Raul”, completa Jotta Erry. O Maluco Beleza estará onipresente. Raul Seixas continua sendo negligenciado ou mal-compreendido pela elite, pela intelectualidade. Mas na periferia, ele é reverenciado. Toca Raul!

Mais:
1ª Mostra Cultural Arte dos Hippies:
Dia 09/03 (domingo), das 10h às 20h.
Praça do Campo Limpo – Estrada do Campo Limpo s/n.
Entrada franca. (11) 9969-3181 c/ JottaErry.
bandaraizesdejave@yahoo.com.br

Eleilson Leite é colunista do Caderno Brasil de Le Monde Diplomatique.

Aline


1967… podcast

Antes de tudo, algumas considerações:

* Estamos esperando a resposta dos nossos avaliadores… como nem somos ansiosas, já dá pra imaginar que a essa altura do campeonato não temos mais unhas, esmaltes e nem cutícula…

* Segunda começa a diagramação…

* ai, ai… suspiros…

Bom, enquanto a correria não passa, uma dica:

“Valeu a espera, olha aí o quarto volume da série! Esta semana o Freakast volta no tempo para o ano de 1967 e relembra as bandas, as músicas, os discos e os festivais que balançaram aquele ano excepcional para a história da música. Acompanhe este verdadeiro teste de memória com Pablo Peixoto, Ricardo Schott, Leonardo Bomfim, Rafael Saldanha e um elefante cor-de-rosa.”

Ficou curioso? Clica aqui então!

 Aline


São Francisco celebra 40 anos do "verão do amor"

Mais um post da série: (clipping) preguiçoso…

03/09/2007 – 15h31

São Francisco celebra 40 anos do “verão do amor”
Da Ansa
John Schults/Reuters

Ray Manzarek (ex-The Doors) visita o túmulo de Jim Morrinson, em cemitério de Paris (03/07/2001)LOS ANGELES, 3 SET (ANSA) – Era a cidade da geração beat, no Estado da Califórnia, que mais que qualquer outra conseguiu encarnar os sonhos e as aspirações dos filhos das flores. Quarenta anos após o Summer of Love de 1967, São Francisco celebrou neste domingo o aniversário daquela incrível estação.

Para comemorar a data foi feito um show grátis, no espírito de então, que recebeu algumas das estrelas dos anos 60 como Ray Manzarek dos The Doors, Jefferson Starship, Barry Melton, James Gurley e muitos outros, que tocaram para um público de 40.000 pessoas ainda dispostas a celebrar aquele sonho, mesmo ele tenha acabado de forma triste.

“Pensávamos que podíamos mudar o mundo, pensávamos ter condições de criar um ‘Mundo cristão do amor’, naturalmente não ocorreu. Aqui estamos nós hoje, 40 anos depois, e ainda em guerra. Foi uma grande desilusão”, disse à Reuters Ray Manzarek, de 68 anos, tecladista dos The Doors.Aquele de 1967 foi para São Francisco um verão particular. A cidade se tornou o centro das jovens gerações que queriam viver um estilo de vida diferente. Sob o slogan de “sexo, drogas e rock’n’roll”, pregavam o amor, a abolição das barreiras sociais e a retirada das tropas americanas do Vietnã, e hoje, muitos dos garotos de então retornaram, com alguns cabelos brancos a mais, para cantar os mesmos slogans, fumar maconha e reviver o estilo hippie.

Algumas mulheres, no parque de Golden Gate, vagaram por toda o dia oferecendo abraços grátis a todos, mas a nostalgia e o sentimento de desilusão se mostravam claros na comemoração.”Sinto-me traído por aquelas mesmas pessoas que preconizavam a filosofia hippie, muitos dos ideais que pareciam então muito sólidos foram traídos pelas nós mesmos, pelos mesmos hippies. Muitos de nós o fizeram por dinheiro e se tornaram yuppies e republicanos”, disse Fito De La Parra, percursionista da banda Canned Heat.

 

Barry Melton, conhecido antão pelo apelido de The Fish, que há tempos deixou a carreira musical para seguir a de advogado, disse que o que estragou tudo, os garotos e os ideais, foram as drogas. “Havia uma atitude benigna com a droga, um comportamento muito ingênuo, cometemos erros significativos”, disse ele.

 

O próprio slogan de amor e amizade eternos foram traídos pelos próprios, freqüentemente ocorreram rupturas dentro das tantas bandas de rock que se formaram. “Tínhamos valorizado demais a natureza humana, acreditávamos no amor e na amizade e os enganamos, meu desapontamento se voltou contra mim mesmo”, comentou James Gurley, 67, que tocou com o grupo Big Brother and the Holding Company antes de romper com a líder Janes Joplin, que acabou morrendo posteriormente de overdose. (ANSA)